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Giovana Camargo: a chef paranaense que ajuda marcas food service brasileiras a ‘caírem no gosto’ dos americanos

À frente de ações que levaram o pão de queijo e o petit gateau para as mesas de restaurantes nos EUA, a chef revela que existe uma certa resistência de aceitação de culinárias estrangeiras na terra do Tio Sam

ChefGiovana1
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Ajudar marcas food service brasileiras a ‘caírem no gosto’ dos americanos. Essa é uma das missões profissionais da vida de chef da paranaense Giovana Andreia Sanches Camargo Rodrigues, a chef Gio, que, hoje, nós da Rede Food Service temos o prazer de te apresentar.

 

À frente de ações que levaram o pão de queijo e o petit gateau para as mesas de restaurantes nos Estados Unidos (EUA), a chef revela que existe uma certa resistência de aceitação de culinárias estrangeiras na terra do Tio Sam. “Eu sou Chef de Cozinha especialista em Desenvolvimento de Marcas e Produtos Alimentícios e Consultora de Internacionalização de marcas brasileiras para os Estados Unidos, onde resido. Eu não excluo a possibilidade de abrir o meu próprio restaurante, mas, hoje, também tenho investido em um papel de consultoria para marcas que buscam entrar nos Estados Unidos. Algo que não é fácil, pois o americano tem dificuldade de se adaptar a produtos que não fazem parte da sua realidade. Uma farofa, por exemplo, ele não aceita, porque acha que é um tempero para fazer o frango empanado. Então, é bastante difícil essa adaptação, mesmo nos EUA tendo muitas etnias e culturas. Eu acredito que seja uma herança que trazemos da vivência infantil no paladar adulto. E isso é muito claro nos EUA, porque eles são muito fechados para o novo. Mas, como tenho a experiência de ter inserido com sucesso pratos da nossa culinária nos locais onde trabalhei, diversas marcas têm me procurado para orientar na melhor forma de adentrar no mercado norte-americano”, conta em entrevista exclusiva à nossa reportagem.

 

A chef Gio compartilha também que “eu já ajudei, por exemplo, na entrada do pão de queijo da Forno de Minas nos EUA. Os americanos não entendiam o que era o pão de queijo. Então, eu busquei apresentar como sendo um alimento saudável em função do fast-food ser muito gorduroso. Foi seguindo essa linha que comecei a ir aos restaurantes e deu certo. Passou a vender muito bem. Além disso, nos EUA, a cultura colombiana é muito forte e lá tem um pão que se chama pandebono. Então, quando eu ia em um restaurante que tinha linhagem latina, eu falava pandebono ao invés de pão de queijo. São estratégias assim que surgem quando se conhece bem a realidade dos americanos. Atualmente, também estou lançando um molho de pizza no Brasil. As oportunidades vão aparecendo e temos que aproveitar. No caso do molho de pizza, eu consegui unir essas duas facetas da minha carreira, pois ajudei na criação do produto em si. Fui para a cozinha e ficamos testando até chegar ao resultado final. É uma linha de molho para atender as grandes redes de pizzaria, que agregue sabor e agilize o dia a dia. Estou bem feliz, pois, inicialmente, seriam vendidos 200 mil rótulos para redes atacadistas, mas os pedidos já superaram mais de um milhão”, comemora.

 

QUEM É GIOVANA CAMARGO?

 

Natural de Arapongas, no interior do Paraná, a chef Gio se apresenta como “mãe de duas meninas, uma de 15 anos e a outra de 20, além de esposa há 26 anos de um cara que segurou a onda nas madrugadas de trabalho. O cara que eu chegava em cada cheirando gordura e ele me chamava de ‘pastelzinho frito’. (risos) Sou agregadora, recebo os imigrantes como se fosse parte da família, adoro uma festa e mesa cheia de amigos. Não aceito não como resposta, porque para tudo, menos a morte, tem uma solução. Ainda sou mãe de três cachorros e avó de mais de dez”, relata.

 

A Chef paranaense Giovana Camargo – Divulgação

 

Exclusivamente sobre o seu lado profissional, a chef detalha que “sou calada, sistemática, nem pareço ser a mesma pessoa. Eu me vejo como uma profissional estrategista, apaixonada em ser e fazer das pessoas mais bem sucedidas. Na cozinha, em grandes eventos de gala ou em premiações, eu procuro ser sempre gentil, seja para com o presidente ou para o porteiro de uma empresa. O meu estilo de culinária é simplificar com sabor. Hoje em dia, pelo menos nos EUA, é super demodê ficar ‘travestizando’ nomes de pratos. Eu tenho a minha própria horta, meu próprio pomar, cozinho com a magia de poder plantar e colher para, depois, cozinhar. E isso é um luxo nos Estados Unidos, as coisas simples. Sou muito mais do ‘panelão’ do que do que ‘petit comitê’”, garante.

 

FORMAÇÃO E PRIMEIRO CONTATO COM O UNIVERSO FOOD SERVICE

 

Já sobre a sua formação e primeiro contato com o universo food service, a chef Gio divide que “a minha paixão pela culinária começou desde criança. Em casa, ninguém cozinhava, mas eu sempre buscava entender sobre a cozinha. Meu pai tinha uma fábrica de doces típicos das festas de São Cosme e São Damião, então, eu cresci no mundo alimentício. E, quando eu tinha 20 anos, fui para Londres, na Inglaterra, e me aventurei em um restaurante, onde fiz um intercâmbio de cerca de seis meses. Fiquei encantada com a estrutura do restaurante. Com isso, fiquei com aquele desejo de trabalhar em um grande restaurante. Mas, infelizmente, quando eu voltei do intercâmbio, o meu pai pegou um câncer muito sério e acabou falecendo. Depois, eu me casei com meu marido, com quem estou há 26 anos, nos mudamos para Bonito, no Mato Grosso do Sul, onde a ideia era montar um restaurante. No entanto, eu não me senti preparada. Então, após quatro anos em Bonito, voltamos ao Paraná para eu começar a estudar culinária. Nessa época, tinha inaugurado em Londrina uma escola que era filiada da maior escola de culinária da América, o Instituto de Culinária da América (CIA). Eu comecei nessa escola e me formei em todos os graus (cerca de um ano e meio). E, com a experiência em Londres, eu pensava que não queria ensino técnico e sim profissional. Dessa forma, eu prestei vestibular e fui para universidade em Londrina. E, durante esse tempo, os meus olhos sempre ficavam em querer uma cozinha profissional. Comecei, então, a juntar meu dinheiro e viajar para fora nas férias. Na primeira vez, fui para a Le Condor Bleu de Paris, na França, onde fiz um curso rápido de quinze dias e eu pensei ‘meu deus, é disso que estou falando, isso que estou buscando’. Não contente, nas próximas férias, fui para a Condor Bleu de Miami, nos EUA, onde fiz o mesmo curso rápido para conhecer a escola e ver como era a dinâmica. Isso em 2015. E, depois que eu voltei de Miami, voltei convencida: ‘em dezembro, irei me matricular na Le Condor Bleu’. Meu marido ficou ‘como assim?’, mas expliquei para ele o meu desejo de uma culinária profissional. Eu encontrei o lugar, me inscrevi e não tinha a certeza de ser aprovada ou não. Mas, depois de aguardar por cinco meses, no final de novembro, quando estava acabando a minha primeira graduação em Londrina, veio a resposta de que tinha sido aprovada. Foi uma loucura com duas filhas, vida, cachorro, mas, assim que eu recebi a aprovação, avisei que estava indo. O universo fluiu e tudo deu certo. Todos foram comigo. Fiz a Condor Bleu de Orlando, nos EUA, e fui para a escola sendo a única brasileira na turma. Tive o privilégio de pegar a última turma, porque, depois da minha turma, a escola fechou em toda a América. Eu me graduei, me formei e, logo em seguida, já entrei no mercado de trabalho americano profissional e com as cozinhas estruturadas que eu conheci em Londres”, detalha.

 

EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS

 

A chef Gio possui passagens por cozinhas célebres, como a de Emeril Lagassé, famoso chef americano, e a do Four Seasons, o hotel mais luxuoso localizado dentro do parque temático da Disney. Assim como, a chef relembra que “quando eu sonhava com a culinária, eu era obcecada pelo Emeril Lagasse. Eu adorava tudo o que ele fazia. Por isso, era um sonho trabalhar em um dos restaurantes dele e realizei isso em 2016, logo após terminar a minha formação na Le Cordon Bleu. Fiquei na Rede Emeril até fechar, porque, infelizmente, antes da pandemia de Covid-19, as duas unidades que tinham em Orlando fecharam. Em 2018, fui contratada pela Cheney Brothers, a maior distribuidora no ramo alimentício do estado da Flórida, um food service de renome, o que me permitiu trabalhar dentro das cozinhas da Universal Studios e da Disney World.  E, após dois anos lá, fui contratada como Corporate Chef no Four Seasons, o hotel mais luxuoso localizado dentro do parque temático da Disney”, explica.

 

MOMENTOS MARCANTES E PRÊMIOS CONQUISTADOS

 

A partir da sua formação e experiências profissionais internacionais, naturalmente, a chef Gio já passou por momentos marcantes na sua vida profissional, como durante a pandemia de Covid-19, quando, conforme ela, “foi um período muito louco para todo mundo. Eu acho que estou até os dias de hoje tentando digerir o que jamais será digerido, o porquê fez parte da nossa existência. Além disso, em dezembro de 2022, por exemplo, eu resolvi me demitir de um trabalho que me dava muita grana, de um trabalho bem-sucedido e fui para a Itália e a Inglaterra estudar queijo, um mercado com poucos especialistas nos Estados Unidos. Eu fui, estudei e me formei, assim como fui contratada para trabalhar no Magic Kingdom, o parque mais importante da Disney, onde fiz os treinamentos, os testes físicos e de sangue. Eu estava aprovada e pronta para começar a trabalhar no dia 15 de março de 2020. Acho que todo mundo se lembra dessa data, né? Foi quando tudo começou e, na semana seguinte, começamos a perder família no Brasil. Meu sogro foi o primeiro e não podíamos viajar. Os restaurantes e parques dos EUA ficaram parecendo cidade fantasma. Foi traumático, mas passou”, lamenta.

 

Em relação aos prêmios já conquistados durante a sua carreira, a chef destaca “o Prêmio Spirits of Aloha, que eu ganhei da Federação Americana de Culinária (ACF) e foi, realmente, um momento muito especial. Eu, inclusive, fui a única brasileira premiada na história dessa federação em um jantar com mais de mil chefs, sendo os mais gabaritados dos Estados Unidos. Acho que fiquei mais de um mês em êxtase pelo prêmio. E eu também cheguei a ser selecionada para o Master Chef anos atrás, antes da pandemia de Covid-19. Mas, na mesma época, eu consegui uma excelente oportunidade de emprego e optei pelo trabalho”, esclarece.

 

ROTINA COMO CHEF INTERNACIONAL

 

Atualmente, a chef Gio, tem se dedicado, em paralelo à sua atuação nas cozinhas de alta gastronomia, a prestar consultoria a marcas brasileiras que buscam entra no mercado americano.

 

Nesse contexto, ela realça que “vida de chef está muito longe do glamour. Aliás, nós estamos sempre prontos para oferecer e fornecer o glamour para quem está se divertindo. Hoje em dia, eu trabalho desenvolvendo produtos alimentícios para indústrias do ramo no Brasil, bem como a internacionalização dos mesmos. A vida de chef é suada, principalmente, no fim de ano. Porém, a organização que encontramos nos Estados Unidos faz com que a engrenagem funcione em uma sistemática mais leve do que encontramos no Brasil”, considera.

 

A Chef paranaense Giovana Camargo – Divulgação

 

A chef destaca também sobre o seu cotidiano na área da alimentação em que “eu tenho mais de uma década para não ser indelicada comigo mesmo, mas tenho muitos anos de profissão e já trabalhei em diversos lugares, do lixo ao lixo. Já me machuquei muito, me queimei e queimei alimentos. Tirei muito lixo e lavei muita cozinha. A pessoa que enxerga a cozinha tão simplesmente como glamour jamais vai ser bem-sucedida na área. A pessoa que não entender que, além de habilidade, também é preciso ter técnica, vai apanhar bastante para crescer. A cozinha é apaixonante, pois dentro dela existe uma adrenalina que não se encontra em outros lugares. Alimentar pessoas é um dos maiores dons de Deus na minha opinião. Entretanto, muitas vezes, a vaidade faz com que as pessoas percam essa essência”, alerta.

 

ATUAIS DESAFIOS, META E SONHO COMO CHEF INTERNACIONAL

 

Apesar de já realizada com chef internacional, a chef Gio afirma que possui alguns desafios, meta e sonho de carreira, uma vez que “sou obcecada em levar a nossa cultura culinária brasileira para as mesas dos americanos e isso se estende a restaurantes, supermercados e grandes distribuidoras, tendo obtido bastante êxito nesse meu sonho, que, hoje, já é uma realidade”, justifica.

 

A Chef paranaense Giovana Camargo – Divulgação

 

A chef acrescenta que “eu tenho também o desejo de formatar as grandes redes de restaurantes do Brasil que tenham como sonho internacionalizar. Afinal, desde que eu cheguei aos Estados Unidos, em 2015, eu presenciei muitas grandes marcas brasileiras perdendo muito dinheiro em terras americanas pelo não conhecimento da operação de restaurantes por aqui. Com isso, eu tenho o desejo de não ver mais grandes marcas brasileiras perdendo dinheiro inimaginável pela não cultura de operação no mercado americano. Quero também ajudar os chefs brasileiros, a parte estrutural do que é trazer uma marca, especialmente de restaurantes para cá sem o trauma que já foi causado no passado, porque eu vi muitas marcas brasileiras quebrarem. Isso é como uma apunhalado no meu coração e, infelizmente, acontece com bastante frequência. Eu, por exemplo, já acompanhei vários restaurantes brasileiros que tentaram conquistar o paladar do norte-americano, mas acabaram falindo. Um dos poucos casos de sucesso e que eu tenho muito orgulho, pois, na época, eu trabalhava como especialista latina para eles, é o restaurante carioca Boteco do Manolo, que, na minha opinião, depois das gigantes Fogo de Chão (churrascaria) e Texas de Brasil (também churrascaria), foi o primeiro restaurante que soube entender o sistema norte-americano. Eu conversava muito com o Marcelo Manolo, que é um dos donos, e com seu chef. Na empresa de distribuição de alimentos que eu trabalhava, tinha uma cozinha para testes e, junto do Marcelo e do seu chef, compilamos as carnes, os molhos, os produtos que eles precisariam para poder gerir o restaurante. Então, eu recebi o Marcelo lá e fui muito sincera ao comentar que vi muito brasileiro tentar e não conseguir. E isso era traumático. Ele foi muito aberto as minhas sugestões. Eu disse, por exemplo, que o foco deveria ser apresentar a sua comida para os norte-americanos e não priorizar os turistas. Ele entendeu isso e, hoje, 50% de sua clientela é da população local e turistas de várias etnias. Eu fico feliz de ver que o restaurante está indo muito bem, já abriu mais três franquias, mas, infelizmente, o caso dele é uma exceção, pois muitos restaurantes brasileiros tentam entrar nos EUA sem antes se esforçar para entender as particularidades de perfil de consumidor e local. O principal erro, na maioria dos casos, é de estratégia, pois é preciso entender que, por mais famoso que seja o restaurante no Brasil, a marca é desconhecida para a maioria da população norte-americana. Muitas vezes chegam aqui querendo colocar o mesmo preço de um restaurante tradicional. A chance de fracasso é alta. Good Food – Reasonable Price é o mantra para dar certo na América, que é comida boa com preço justo”, aconselha.

 

VISÃO DO MERCADO FOOD SERVICE COMO CHEF INTERNACIONAL

 

Para a chef Gio, “os Estados Unidos e Brasil são dois mundos totalmente diferentes, principalmente, falando de grandes redes atacadistas. Em especial, a logística de entrega é impecável, fora o que eu tenho desenvolvido no Brasil e com muito sucesso, a otimização do tempo em restaurantes com pré-preparo e o desperdício de produto (na ponta do lápis tudo é custo).  Nos Estados Unidos, grandes empresas já entregam aos restaurantes até as frutas cortadas em formatos específicos. E isso é só um exemplo e que também acontece com caldos, proteínas, carboidratos e a Mise en Place (pré-preparo, na língua francesa, uma frase que tenho até tatuada no meu braço). E é essa cultura que tenho levado com bastante êxito para o food service brasileiro”, avalia.

 

A chef pontua ainda que a “a cozinha é alquimia e alquimia é química pura, tudo se transforma, tudo se reinventa. Mas, eu ainda sou das ativistas do keep it simple, que é manter as coisas simples, a cozinha com menos frescura e mais sabor”, assinala.

 

DICAS DE CHEF INTERNACIONAL

 

Por fim, Gio deixa a seguinte dica de chef internacional para quem, assim como ela, almeja seguir uma carreira bem sucedida e verdadeira no segmento de alimentação fora do lar: “esqueça o glamour. Aprenda as técnicas básicas da cozinha. Estude e sempre tenha o pré-preparo (mise en place) como mantra principal para qualquer cozinheiro”, indica.

 

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