Representar o povo indígena tanto na vida pessoal, quanto no campo profissional. Esse é o propósito que move Kalymaracaya Mendes Nogueira, de 43 anos, natural da Aldeia Bananal, Distrito de Taunay, em Aquidauana, no Mato Grosso do Sul, a única Chef Indígena do Brasil.
Em entrevista exclusiva à Rede Food Service, Kalymaracaya revela que “trabalhar com Gastronomia no Brasil sendo indígena é uma grande responsabilidade. Além de ser mulher, sou a única Chef Indígena do país, o que me coloca em uma posição pioneira. E, sempre que eu menciono isso, faço questão de afirmar que eu me apresento como sou: uso cocar, adereços e pinto o meu rosto. E faço tudo isso para valorizar e representar a cultura indígena em cada detalhe, já que eu avalio ser fundamental divulgar a gastronomia indígena para outras partes do Brasil, pois, infelizmente, é uma culinária ainda pouco conhecida, mas de imensa importância no cenário nacional. Eu tenho enfrentado muitos desafios com determinação e, onde quer que eu vá, eu procuro fazer a diferença. Eu sempre levo comigo a riqueza da nossa cultura, que vai além da gastronomia e inclui também o artesanato e outros elementos culturais. As pessoas, hoje em dia, conhecem melhor a culinária indígena, porque nunca aceitei um ‘não’ como resposta e lutei arduamente para ser uma voz ativa na divulgação dessa riqueza. Para mim, cultura e gastronomia andam lado a lado, porque, para conhecer a cultura de um povo, você terá que conhecer também a sua gastronomia”, afirma.
QUE TAL CONHECER MAIS SOBRE A TRAJETÓRIA DA ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL?
É só conferir na sequência:
- QUEM É KALYMARACAYA MENDES NOGUEIRA?
- A CULINÁRIA DA ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
- FORMAÇÃO E EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
- MOMENTOS MARCANTES COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
- ATUAL ROTINA COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
- VISÃO DO MERCADO FOOD SERVICE COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
- DESAFIOS DE TRABALHAR COMO GASTRONOMIA NA ERA DIGITAL
- PLANOS E SONHOS COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
- DICAS PARA QUEM DESEJA SER CHEF DE COZINHA NO BRASIL
QUEM É KALYMARACAYA MENDES NOGUEIRA?
Casada com Washington Luiz Albuquerque da Silva, Kalymaracaya não possui filhos e se considera “uma pessoa determinada, dedicada aos estudos e comprometida com um objetivo claro: representar o povo indígena tanto na vida pessoal, quanto no campo profissional. As minhas principais inspirações são os meus familiares: Francisca Maranhão Pio, a minha avó, minha mãe Margarida Mendes Nogueira (Hilna Mopoy) e a minha tia Silvia Mendes. Eu sou uma pessoa que, nas horas vagas, gosto de estudar, ler livros e assistir vídeos no YouTube”, se apresenta.

Especificamente sobre o seu lado profissional, a única Chef Indígena do Brasil partilha que “eu integro as minhas raízes culturais em tudo o que eu faço, sempre utilizando a gastronomia como uma forma de valorizar e divulgar a riqueza da culinária indígena. É por meio do meu trabalho que eu busco levar a cultura do meu povo a novos públicos, sempre com muito orgulho. O que mais me caracteriza, tanto como pessoa, quanto como Chef de Cozinha, é a humildade. Eu valorizo a capacidade de ouvir e aprender com os outros, especialmente com aqueles que possuem grande conhecimento. Eu acredito que essa abertura para o aprendizado contínuo e para diferentes perspectivas é essencial, tanto no crescimento pessoal, quanto no desenvolvimento profissional, pois sempre há algo novo a ser aprendido e aplicado na minha carreira”, considera.
A CULINÁRIA DA ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
De acordo com Kalymaracaya, a sua receita carro-chefe “é, sem dúvida, o Hî-hî, que é um bolinho de aipim envolto na folha de bananeira”, divide.
A única Chef Indígena do Brasil explica também que a sua culinária é a indígena real, sendo “a que utiliza os ingredientes nativos, é uma cozinha natural. A culinária indígena é feita sem muitos temperos e não existe certo ou errado. E, dependendo do que você cozinha, por exemplo, na cozinha indígena, não tem um prato de entrada, uma vez que essa entrada pode ser o prato principal. Assim, para podermos entender essa rica culinária, primeiro, devemos esquecer aquelas técnicas francesas. A gastronomia indígena, por exemplo, não tem certos pontos da carne, o que temos hoje sempre são carnes de caça muito bem passadas e nada cru. Na gastronomia indígena brasileira, não consumimos carne de caça mal passada, por exemplo, há exceções de insetos, como o Tapuru, que se come cru. Nós temos ingredientes incríveis, como a castanha de bocaiuva, pequi, cumbaru, castanheira, castanha do pará, mel de jatei, palmito guariroba, bacuri, bocaiuva, milho saboró, guavira, carnes de caça, peixes de rio, mandioca, batatas, doce, inhames, cará, folha de taioba, trevo de três folhas, café de fedegoso, óleo de bocaiuva, banha de quati, porco monteiro, etc. E a principal característica da minha culinária é a cozinha contemporânea, pois eu trabalho com pratos tradicionais. Com isso, quando faço o Hî-hî, por exemplo, não vai sal e nem açúcar e eu procuro dar um ar de contemporaneidade no acompanhamento”, realça.
Confira no nosso canal do Youtube: O PETIT GATEAU MAIS FAMOSO DO BRASIL
FORMAÇÃO E EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
Kalymaracaya possui formação no Curso Profissionalizante em Cozinha da
Escola Ezequiel Ferreira Lima, graduação em Turismo pela Faculdade da FUNLEC-IESF e pós-graduação em História e Cultura Indígena e Afro-brasileira pelo Instituto Alfa América. Além disso, atualmente, ela é mestranda em Antropologia Social pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e, desde 2014, atua no movimento Slow Food, assim como já participou de projeto de pesquisa realizado pelo Instituto Paulo Machado com pimentas crioulas das indígenas Terena. E, em prol da comunidade indígena, ela também é Secretária do Conselho Comunitário Urbano Indígena de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, mais conhecido como C.C.U.I, por meio do qual luta ao lado de Conselheiros por melhorias em diferentes áreas sociais.

Ao todo, a única Chef Indígena do Brasil possui dez anos de carreira, sendo que, “desde pequena, eu já ajudava a minha avó, tia e mãe a prepararem os alimentos. Eu era aquela que estava sempre por perto da cozinha, que queria aprender e tinha curiosidade. Desde muito cedo, eu já andava nas matas atrás de algum alimento dos frutos do cerrado. Eu achava tão bonita a arte de transformar alguns ingredientes em comida. Por isso, eu faço questão de apresentar os nomes que me ajudaram na construção da minha carreira, que são a minha mãe Margarida Mendes Nogueira (Hilna Mopoy), a minha tia Silvia Mendes e a minha avó Francisca Maranhão Pio”, ressalta.

Kalymaracaya acrescenta que, após a sua fase de criança/adolescente, começou um novo ciclo na sua vida. “Na faculdade onde eu estudava, os estudantes precisavam fazer trabalhos e, nessa hora, eu tive a feliz ideia de levar junto alguns pratos tradicionais da minha comunidade. E, assim, eu percebi que eles eram bem aceitos. E, quando eu estava na faculdade, eu comecei a refletir que poderia, de alguma forma, representar o meu povo por meio da gastronomia, quando eu comecei a lutar com todas as forças, ainda que várias pessoas me falassem não e foram vários nãos que eu recebi. No entanto, ainda que eu passasse por ‘louca’ muitas vezes, eu nunca desisti de lutar. Por isso, eu estudei, me formei e fiz todos os cursos de Gastronomia que tinha na minha cidade. Enfim, eu me formei e estava diante do desemprego e apenas com o sonho de ‘representar o meu povo’. Por isso, eu passei muitas dificuldades e preconceitos até que surgiu a era digital e a Internet me ajudou muito, pois eu usei as mídias sociais e escrevi para um Chef que eu vi na televisão contando sobre o meu desejo de divulgar a gastronomia indígena. O nome desse Chef é Fabio Cunha e ele me disse que morava em João Pessoa, na Paraíba, e que, infelizmente, eu não poderia trabalhar com ele. Porém, ele me apresentou para um amigo dele, o Chef Paulo Machado, que me disse que era para conversarmos e eu explicar a minha situação. Dessa forma, em janeiro de 2015, eu conheci o Chef Paulo Machado e, desde esse dia, quando eu tirei uma foto com ele e fiz um vídeo e ele colocou nas mídias sociais Instagram e Facebook, as pessoas começaram a se interessar pelo meu trabalho. Hoje, eu recebo convites para participar de eventos nacionais, internacionais e faço palestras e campanhas publicitárias”, resume.
MOMENTOS MARCANTES COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
Como já adiantado por Kalymaracaya, ser a única Chef Indígena do Brasil é desafiador e prova disso é que ela teve “uma experiência que marcou profundamente a minha carreira. Anos atrás, eu concorri a uma vaga como professora de Gastronomia na minha cidade. Na época, eu fui convocada para ministrar uma aula como parte do processo seletivo, mas, durante a entrevista, a avaliadora, que até hoje é Gerente Regional, fez comentários que eu jamais esqueci. Ela elogiou meu currículo, mas ressaltou que eu havia estudado em escola pública. Em seguida, pegou o currículo do meu concorrente e comparou, destacando que ele havia feito um estágio na Europa, enquanto eu tinha permanecido na minha cidade. E, como se isso não bastasse, ela enfatizou que ele havia estudado em Águas de São Pedro, perguntando com ‘desdém’: ‘você sabe o que isso significa?’. Mas, para piorar, ela também me perguntou se eu era indígena e anotou isso no meu currículo. Eu saí daquele lugar em lágrimas, mas com uma única ideia na cabeça: a de que, um dia, eu daria aula em Águas de São Pedro. E, nove anos depois, para a minha grande satisfação, eu fui convidada para ministrar uma aula naquela mesma escola de Águas de São Pedro. Foi um momento de superação, de vencer toda a humilhação que enfrentei naquela época, provando para mim mesma e servindo de exemplo para outras pessoas que, com determinação, é possível superar qualquer obstáculo”, assegura.

Outras ocasiões importantes na sua carreira que Kalymaracaya não esquece são o fato dela ter vencido a prova de comida indígena, assim como ter sido uma convidada especial, de edições do programa de televisão MasterChef Brasil, também ter sido convidada especial do programa The Taste Brasil e, ao lado do Chef Paulo Machado, terem sido os responsáveis por dois dos pratos do jantar da posse do Presidente Lula, em janeiro de 2023.
ATUAL ROTINA COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
A atual rotina de Kalymaracaya como a única Chef Indígena do Brasil é marcada por participações em eventos nacionais e internacionais, além de atuar com campanhas publicitárias e ministrar palestras e cursos. E, conforme ela mesma considera, “ser chef para mim é dedicar-se intensamente para atender às expectativas dos paladares mais exigentes. É uma carreira que exige muito trabalho e paixão. Além disso, a vida de chef tem dois lados bem distintos. O lado do glamour, que é o que geralmente, aparece na mídia por meio de programas de televisão, câmeras e a participação de celebridades, criando uma imagem atraente e sofisticada. No entanto, essa é apenas uma parte da realidade. O outro lado, que muitos não veem, é o trabalho árduo e intenso que envolve longas horas na cozinha, gerenciando uma equipe, lidando com a pressão de inúmeros pedidos e cuidando da administração do restaurante. É um trabalho que exige dedicação, disciplina e muito esforço, indo muito além do que se vê nas telas”, assinala.
VISÃO DO MERCADO FOOD SERVICE COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
Para Kalymaracaya, “o mercado de food service está passando por um momento de crescimento e amadurecimento. Crescimento porque o mercado de food service continua a crescer devido às mudanças no comportamento do consumidor e nas necessidades da sociedade moderna. Hoje em dia, as pessoas estão, cada vez mais, buscando conveniência, o que impulsiona o aumento de restaurantes, delivery, fast-food e opções de refeições prontas. E o amadurecimento do mercado se refere ao fato de que ele está se tornando mais sofisticado e competitivo”, avalia.

Nesse sentido, a única Chef Indígena do Brasil acredita que vale a pena investir “no mercado food service, pois ele está em plena expansão no Brasil. E, aqueles que conseguirem reunir os elementos essenciais para um negócio de sucesso, como qualidade, inovação, boa gestão e estratégias eficientes de marketing, têm grandes chances de se destacar e prosperar nesse setor”, enfatiza.
DESAFIOS DE TRABALHAR COMO GASTRONOMIA NA ERA DIGITAL
Kalymaracaya tem a era digital como sua aliada. Afinal, foi a partir do advento da Internet e das mídias sociais que ela conseguiu divulgar o seu diferenciado e rico trabalho com a gastronomia indígena. No entanto, a única Chef Indígena do Brasil alerta que, ao mesmo em que a era digital é benéfica, ela também traz alguns desafios aos profissionais do ramo de alimentação fora do lar. “A atual influência das mídias sociais nos negócios food service, de uma forma geral, é extremamente significativa e transformadora, pois elas desempenham um papel central em estratégias de marketing, engajamento com o público e construção de marcas. Porém, os desafios de trabalhar com gastronomia na era digital estão diretamente ligados à necessidade de adaptação às novas tecnologias e às exigências dos consumidores conectados. Hoje, quem não está presente nas mídias digitais, está perdendo oportunidades valiosas de contato com clientes e, consequentemente, deixando de gerar receita. As redes sociais, por exemplo, são ferramentas poderosas que podem expandir o alcance do seu trabalho de forma exponencial. Um único vídeo ou foto bem produzidos no Instagram podem gerar uma grande visibilidade para seu negócio, atraindo novos clientes e criando engajamento. Entretanto, para aproveitar todo esse potencial, é essencial saber usar essas plataformas de maneira estratégica, criando conteúdo relevante e autêntico, que se conecte verdadeiramente com o público. Portanto, a era digital oferece muitas vantagens, mas também exige conhecimento e planejamento para que as mídias sociais sejam utilizadas da forma mais eficaz possível”, argumenta.
PLANOS E SONHOS COMO A ÚNICA CHEF INDÍGENA DO BRASIL
Obstinada, Kalymaracaya possui mais planos e sonhos como a única Chef Indígena do Brasil. “Eu quero ser referência nacional e internacional no assunto de culinária indígena, ter um restaurante temático indígena e ter um programa de televisão sobre cultura e culinária indígena”, elenca.
DICAS PARA QUEM DESEJA SER CHEF DE COZINHA NO BRASIL
Ficou inspirado (a) pela história de Kalymaracaya não é mesmo?
Logo, saiba que, conforme a única Chef Indígena do Brasil, para seguir carreira no segmento de alimentação fora do lar é necessário “estudar de forma abrangente. Além de se aprofundar na Gastronomia, é essencial adquirir conhecimentos em outras áreas, como a Administração, Nutrição, Contabilidade e Mídias Digitais. Essas habilidades complementares são fundamentais para o sucesso, pois o trabalho de um Chef vai muito além da criação de pratos. É preciso entender como gerir um negócio, cuidar da saúde dos clientes e saber utilizar as ferramentas digitais para promover o seu trabalho e alcançar novos públicos. E para o Chef que já é empresário no ramo de food service, a minha dica é manter um foco constante na qualidade dos alimentos e investir na divulgação por meio das mídias sociais. A continuidade na excelência e a presença online são fundamentais para o sucesso contínuo. Já para aqueles que estão começando, é importantíssimo investir tanto na qualidade dos produtos, quanto na publicidade do seu negócio. Garantir que os seus alimentos sejam de alta qualidade e utilizar estratégias eficazes de marketing são fundamentais para estabelecer uma base sólida e atrair os seus clientes”, aconselha.
André Wunderlich, o chef que fez do Nordeste brasileiro a sua nova casa

- Tabata Martinshttps://redefoodservice.com.br/author/tabata/
- Tabata Martinshttps://redefoodservice.com.br/author/tabata/
- Tabata Martinshttps://redefoodservice.com.br/author/tabata/
- Tabata Martinshttps://redefoodservice.com.br/author/tabata/