Não adianta negar. O café é uma das bebidas queridinhas dos brasileiros. Há algo no líquido capaz de conquistar para além do paladar. O consumo do ouro negro já faz parte da cultura nacional e seu cultivo continua sendo um dos destaques da economia. Segundo dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), 35 a 40% de todo o café consumido no planeta tem origem brasileira. Apesar da preferência nacional ainda ser a versão quente da bebida, a popularidade dos cafés gelados tem crescido no país, ganhando admiradores das mais diversas idades. A onda dos cafés especiais e dos drinks a base do líquido contribuiu para proporcionar novas experiências à mesa e tornou a bebida uma tendência de mercado. Isso, somado ao fato do Brasil ser um país tropical, torna fácil imaginar que, vencida a resistência inicial, a versão fria do café tem tudo para alçar voos ainda maiores. Já provou? Depois desse texto você também não vai resistir!
Origem do café gelado
Versátil, o café pode ser preparado de várias maneiras. E na apresentação fria não é diferente. A origem do chamado cold brew – um método de infusão que não utiliza água quente para extrair as características do grão, resultando em uma bebida gelada, com sabor refrescante e leve – está no século XVII. A técnica nasceu da necessidade de preservar o café para ser transportado em longas viagens ou conservado durante períodos de guerra, assim ele poderia ser aquecido e consumido depois. Os holandeses são tidos como os precursores do cold brew. Porém, logo os japoneses e franceses incorporaram e aprimoraram a técnica.
O chamado “Kyoto-style coffee”, uma adaptação dos famosos e milenares chás preparados pelo Japão, é o primeiro registro de café gelado no país. Por volta de 1830 é que surgiu a versão mais conhecida hoje em dia, quando os franceses desenvolveram o Mazagran, uma mistura de café adoçado com água gelada. A invenção virou uma explosão mundial, ganhando mercado na Europa, América e Japão.
No Brasil
A empresa Kaffe Torrefação e Treinamento, um projeto da barista Lidiane Santos em parceria com o otorrefador Eudes Santana, seu marido e sócio, foi fundada em 2017 com base na Terceira Onda do Café, movimento internacional que passa pelo aumento do consumo de grãos especiais e no qual o café é percebido como um produto artesanal, com características sensoriais e atributos como qualidade, origem, torra e métodos de preparo, sendo uma das pioneiras do Recife, capital de Pernambuco, nesse segmento. “A empresa foi pensada para atender as necessidades das cafeterias e dos consumidores que buscam cafés frescos e de qualidade. Atualmente, fornecemos cafés para seis estados do Nordeste, em mais de 50 cafeterias e restaurantes, além de uma cervejaria parceira”, explica Eudes em entrevista exclusiva para a Rede Food Service.
Os cafés gelados compõem o menu da Kaffe desde a inauguração da empresa, já que, apesar da resistência inicial dos brasileiros, a versão fria da bebida já é tradicional no exterior e faz parte do cardápio das cafeterias mundo afora. “Nosso centro de operações é no Nordeste, região onde as temperaturas são sempre altas. Assim, as pessoas têm adorado se refrescar com cafés gelados. Como temos como base o movimento da Terceira Onda do Café, o cold brew não poderia faltar. Puro ou em drinks não alcoólicos, é uma bebida que está sendo muito requisitada”, afirma.
Ainda assim, é preciso inovar nos sabores para atrair e fidelizar o público. As opções de cafés gelados disponíveis na Kaffe incluem o Citrus, café extraído a frio, servido com gelo e limão siciliano; o YellowSubmarine, café extraído a frio, água com gás, syrup de maracujá e gelo; o Sweet Orange, café extraído a frio, água com gás, syrup de laranja Bahia e gelo; o Latte Gellato, espresso com leite gelado batido e gelo; e Mocha Gelatto, espresso, com creme de chocolate, leite cremoso e gelo.
Esse último, inclusive, foi adicionado ao cardápio recentemente. Começou a ser comercializado apenas em 2021, mas já é um dos grandes sucessos da empresa. Em um ano, o Mocha Gelatto aumentou em 300% seu volume de vendas.
Além dos cafés gelados, no cardápio da Kaffe ainda é possível conferir chás e cafés quentes espresssos e clássicos, além de bebidas lácteas e cafés filtrados no Koar – sistema de extração criado em Pernambuco. A proposta da empresa é que o cliente possa escolher grãos de terroirs, processos e produtores variados, com o objetivo de comparar as variações sensoriais em diferentes extrações.
Já o Lucca Cafés Especiais, localizado em Curitiba, com loja virtual e de assinaturas, começou a trabalhar com cafés gelados por volta de 2015. Segundo Mateus Cruz, responsável pelo marketing da empresa, a procura pela versão fria tem aumentado de lá para cá. “O café especial, de um modo geral, tem ganhado mais notoriedade. Consequentemente, a procura por novas maneiras de se preparar café também. Já há essa tendência na Àsia e América do Norte e o Brasil vem seguindo esse mercado”, explica.
Na cafeteria, na hora de decidir os sabores, a tradição é determinante. “No Lucca prezamos por manter a tradição, então servimos sabores clássicos, que tem como base o cold brew, uma extração a frio do café que leva em torno de 24h, que pode ser bebida pura, com leite e/ou caldas de chocolate e caramelo. A exceção é o espresso tônica, que leva uma dose de espresso”.
Mateus ainda revela que na cafeteria não há um estilo de consumidor definido para os cafés gelados. A bebida, tão cheia de possibilidades, tem se saído bem com todos os públicos, o que mostra o potencial desse mercado.
Visão de mercado
Para Lidiane Santos, barista ganhadora do prêmio Melhores do Ano 2017, eleita pela Prazeres da Mesa, o consumo de cafés gelados já se tornou uma tendência no mercado brasileiro e vem ganhando força porque os consumidores gastronômicos, sejam eles de alimentos ou de bebidas, gostam de experimentar o novo e assim criam novos hábitos. “As novidades proporcionam novas experiências sensoriais, que, quando boas, vão sendo cultivadas. Nosso papel é buscar produtos novos, que proporcionem inovação e a mistura de diferentes segmentos. Isso sempre desperta a curiosidade das pessoas, além de atingir os mais diversos setores da sociedade”, explica ela.
Com a atual popularidade da bebida, Eudes Santana também enxerga o café gelado como um mercado crescente e com muito a expandir. “Além das bebidas preparadas com leite, chocolate, caramelo e syrups, que atinge o público jovem e pessoas que gostam de doces, existe ainda o mercado de drinks alcoólicos gelados, que tem tido uma crescente nos últimos anos com a chegada da nova geração de bartenders”, afirma.