Nascido no Sertão do Ceará, pelas mãos de uma parteira, e criado na Zona Leste de São Paulo, o chef Francisco Pinheiro se orgulha em afirmar que faz parte de uma geração mais clássica de cozinheiros. Com 36 anos de experiência, ele aprendeu no dia a dia, na prática, a mágica da cozinha e o respeito pelo ofício. Na bagagem, passagens por importantes restaurantes brasileiros e internacionais, cardápios premiados, realização de cursos e consultorias, participação em dois realities shows culinários e agora se prepara para um novo desafio: a abertura do restaurante Paloni Osteria, especializado em massas frescas, 100% artesanais.
Apesar de gostar de se declarar como cozinheiro, Francisco revela que lutou muito para se tornar um chef. “Trabalhei duro para conquistar esse cargo, que é um status, não uma profissão. O termo ‘chef’ ao longo dos anos foi se vulgarizando, mas é preciso ter em mente que o cargo não é fácil. O profissional tem que saber todas as etapas da cozinha, além de ensinar, gerenciar… É compromisso, responsabilidade, demanda tempo, energia e paciência”, explica Pinheiro.
Ele ainda ressalta que em uma cozinha, todo mundo depende da orientação do chef. “Eu venho de uma geração que chega cedo à cozinha, que vai lá do lado do profissional, seja a praça que for, para ensinar como fazer, como cortar, como montar… Defendo muito a cozinha como escola, como um local para dividir conhecimento e formar pessoas. Minha intenção é tornar cada membro da equipe profissionais ainda melhores”, revela.
Quem é Francisco Pinheiro
Discreto e tranquilo, aos 48 anos, Francisco se define como uma pessoa simples e trabalhadora, que busca levar o sustento de casa desempenhando seu ofício com muita paixão e honestidade. Divorciado, é pai de dois jovens: um menino, Felipe Ducasse Pinheiro, de 24 anos e batizado em homenagem ao chef francês Alain Ducasse, e Fabíola Pinheiro, de 21 anos. Morador da Zona Leste de São Paulo, depois de uma vida sem animais de estimação, hoje ele tem três gatos para chamar de seu: Jorge, Romeu e Nina. Para desconectar um pouco da pressão da cozinha, o chef diz que costuma recorrer a boas leituras de livros de gastronomia. “Também tenho a fotografia e o cinema como hobbies. Entre os esportes, jogos de tênis e bocha são minhas preferências”, diz ele, que também é um amante das motos.

Morador do Tatuapé, Francisco deixou o interior do Ceará ainda criança, quando seus pais se mudaram para São Paulo. Iniciou a vida profissional aos 12 anos, como ajudante em uma padaria que antes também foi empregadora do seu pai. Isso, claro, com uma ajuda do destino. “Havíamos saído, eu e meu pai, para tentar uma vaga de office boy, em outra empresa. Mas o cargo já havia sido preenchido. Na volta, paramos para comer uma coxinha na padaria. Meu pai ficou conversando com o dono, no balcão, e perguntou se havia uma vaga para mim. Lembro que o dono da padaria falou que não tinha vaga, mas que sempre era bom abrir uma oportunidade para futuros talentos. Essa frase ficou na minha cabeça”, diz.
Trajetória e formação
Apesar de ter iniciado no comércio e na panificação aos 12 anos, a primeira carteira de trabalho de Francisco veio aos 14 anos de idade, já com o registro da profissão de padeiro. “Fiquei três anos na padaria, depois sai para o mundo”, diz o chef. Francisco trabalhou no bairro dos Jardins, famoso por seus restaurantes sofisticados, viajou o mundo e estagiou fora do país. “Minha formação é na Escola Francesa, mas sempre ressalto que é uma formação de vida, de aprender diariamente, na prática”.
Assim, aprendeu confeitaria, panificação e cozinha quente, onde adentrou aos 21 anos de idade, comandando seu primeiro restaurante. “Passei por várias casas boas, mas tem umas que foram muito impactantes na minha vida, como o Lê Bistrô e o Attimo. Foi nesse último que consegui ganhar minha primeira estrela Michelin. Outro grande desafio foi cuidar, como chef executivo, da rede de restaurante General Prime Burger. São locais que marcam pelo tamanho dos desafios e pelo sabor das realizações”, relembra Francisco, que ainda tem passagens por restaurantes renomados como Bar Número, Ilha das Flores e Mez.

Em 2003 participou de um concurso de cozinha onde ganhou um estágio na escola de Paul Bocuse, perto de Lyon, na França. No retorno, foi trabalhar com o chef Laurent Suaudeau, na Escola das Artes Culinárias Laurent, onde ficou por cinco anos. “Considero essa experiência minha faculdade e doutorado na gastronomia. Com esse trabalho aprendi a valorizar o ofício e a execução de todos os passos de maneira respeitosa com o produto”, diz.
Adepto da máxima de que menos é mais, de acordo com Francisco, sua comida é uma expressão do momento vivido. “Eu passei por vários estilos de cozinha ao longo da vida. Por muito tempo busquei a perfeição, muitos temperos, eu digo que naveguei no mundo da cozinha 100%. Hoje a minha busca é pelo simples. Opto por cozinhar com simplicidade e elegância, utilizando poucos temperos e extraindo 100% do sabor dos insumos”, diz ele, que é um defensor da valorização dos produtos. “Aos 18 anos eu já tinha uma horta no restaurante, já falava da importância do pequeno produtor, já criava receitas a partir de produtos que estavam mais acessíveis. Busco garantir a valorização do produto em sua totalidade”, afirma.
Participação em realities
Dois grandes presentes. É assim que Francisco Pinheiro define sua participação nos maiores realities shows de culinária da TV brasileira, o Masterchef Brasil Profissionais, da Band, e o Mestre do Sabor, da Rede Globo.
A participação em ambos veio através de convites, ironicamente recusados na primeira tentativa. “Quando recebi o chamado para o Masterchef, não aceitei, respondi que achava que o programa era marmelada. A vida seguiu. Depois, por conta de uma situação com a minha filha, que, em meio a uma brincadeira, manifestou o desejo de me ver no programa, e ao relembrar uma antiga vontade do meu falecido pai, de me ver na televisão, a recusa começou a me incomodar. Não esperava, mas quando veio o segundo convite, respondi sim imediatamente”, conta. No programa, exibido em 2017, Francisco fez uma trajetória impecável, que o levou à semifinal.

“Tenho no coração coisas muito boas sobre o programa. Foi através dele que me tornei conhecido nacionalmente e vivenciei coisas incríveis. Viajei, dei aulas, fiz jantares a quatro mãos com outros chefs, apresentei aula-show em diversas cidades e festivais… Tudo foi muito gratificante”.
Logo em seguida, veio o primeiro convite para o Mestre do Sabor. Para não perder a recémcriada tradição, Francisco só aceitou participar no segundo ano do programa. “Tudo foi magnífico. Meu pai quando era vivo me ensinou que não podemos negar oportunidades. Então tenho certeza que ele, lá do céu, sentado numa cadeira confortável, assistiu aos dois programas. E ficou emocionado pela postura, pelo comprometimento, pela seriedade com que levo meu ofício, seja ele no dia a dia ou dentro de um reality”, conclui.
Novos desafios
Atualmente, Francisco divide seu tempo como chef consultor da nova versão do restaurante Pé de Fava e nos acertos dos últimos detalhes para a abertura do restaurante Paloni Osteria.
Para quem não lembra, originalmente, o restaurante Pé de Fava ficou conhecido em todo o país, de forma negativa, depois de participar do programa Pesadelo na Cozinha, reality apresentado pelo chef Erick Jaquin, na Band. O episódio, inclusive, rendeu os principais memes de todas as temporadas do programa. Apesar da popularidade alcançada, o estabelecimento foi vendido.

O novo proprietário confiou ao chef Francisco a missão de construir um novo Pé de Fava, do zero. “O restaurante saiu do programa com uma imagem muito ruim, então tivemos que pegar isso e reformular o conceito, apresentando um novo Pé de Fava, agora com um serviço extremamente bem feito. Também mudamos o restaurante de lugar. Todo o novo cardápio é assinado por mim, assim como o treinamento da equipe… É tudo responsabilidade minha”, diz.
Francisco conta que a concepção do projeto visa o desenvolvimento de uma cozinha bem feita, que combina simplicidade e elegância em receitas tipicamente brasileiras. Por lá, é possível conferir pratos como baião de dois, fava, carne de panela, carne de sol. “São receitas que todo mundo conhece. Nosso diferencial é a execução, a elegância e a preocupação com a qualidade dos produtos. Por exemplo, eu não permito nenhum tipo de tempero industrializado na cozinha”, explica.
Ser chef consultor ainda dá a Francisco a oportunidade de ensinar e formar equipes, algo que claramente o move na vida profissional. Os clientes têm aprovado as mudanças. “Temos recebido retornos muito positivos”. Um dos destaques do menu é uma entradinha que apresenta ovo orgânico de gema mole com quiabo tostado, uma glacê de galinha caipira e uma espuma de queijo coalho com manteiga de garrafa.
Paralelamente, o chef Francisco toca outros projetos. Em breve ele deve abrir o restaurante italiano Paloni Osteria, de massa fresca 100% artesanal, feita na hora. “Teremos dois masseiros na casa, um na hora do almoço e outro no jantar. Nosso lema é vai para o fogão, vai para a mesa do cliente”, comta. O chef ainda revela que o restaurante utilizará farinha italiana 00, sêmola, azeite, queijo, tudo italiano e de primeira qualidade. Alguns ingredientes brasileiros também estão previstos, para dar um toque especial.
Por lá, o público ainda poderá conferir uma rotisseria, com alguns dos produtos do restaurante à venda, como massas frescas, molhos, pães, focaccias, queijos e muito mais. “Há um ano estamos desenvolvendo tudo com muito estudo e coerência. O restaurante está localizado na Zona Leste, algo que tem um sabor especial para mim, porque minha vida foi nessa região, mas meu trabalho até então, não. Essa é a primeira oportunidade de mostrar meu talento para esse público. É como diz o velho ditado: o bom filho a casa torna”.
Visão de mercado
Francisco afirma que sempre olhou para o mercado de forma otimista, tendo em vista que tudo o que construiu foi dentro do setor gastronômico. “E esse é um mercado que tende a crescer ainda mais, que vem se mostrando uma fonte de oportunidades. Hoje a cozinha possui várias ramificações. O ato de cozinhar pode ser através de vídeos, ensinando, em eventos, em restaurantes, como chef em casa… É um mercado que tem se diversificado bastante”, diz ele.
Há 30 anos, segundo o chef, o acesso ao conhecimento e ingredientes de qualidade, nacionais ou internacionais, era limitado. Hoje, a democratização do acesso aos produtos abriu portas. “Há muitas oportunidades no mercado, para atuação e formação. Vejo isso como algo muito positivo. E sei que grandes coisas ainda estão por vir em um setor que segue se reinventando”.
Dica do chef
Para quem quer trilhar o caminho da gastronomia, o chef tem dicas. “Pesquisem, leiam tudo o que for possível sobre esse universo, isso é importante para desbravar a cozinha e adquirir conhecimento”, avisa. Outra coisa essencial, segundo Francisco, é criar o habito de cozinhar em casa, no seu momento e no seu espaço. “A ideia é que seja só você e a cozinha, sem a pressão de ser um profissional. Assim é possível fazer tudo com calma. É um excelente exercício para se conectar com o ofício, com as receitas, com os processos e ingredientes. Até hoje cozinhar dessa forma me faz entrar em transe. É redescobrir a cozinha e a mim”, diz ele.
Uma resposta
Concordo com as inúmeras oportunidades na área da gastronomia.
Eu mesmo usufruo da oportunidade que tive, realizando eventos, e fazem 20 anos que colho bons frutos dessa oportunidade.
Pena que na área de gastronomia para eventos não existe classificações, entidades que avaliem e destaquem os melhores do ramo, como acontece com os restaurantes, exemplo das estrelas Michelin.
Quem sabe num futuro não muito distante essa realidade mude.